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Cota racial para candidatura é próximo passo, diz juiz do TSE

Magistrado defende reserva de percentual das candidaturas, não das vagas no Congresso

O juiz Fábio Esteves, em Brasília – Pedro Ladeira-12.set.20/Folhapress

Uirá Machado  ,Tayguara Ribeiro
SÃO PAULO
Coordenador substituto da Comissão de Promoção da Igualdade Racial do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o juiz Fábio Francisco Esteves afirma que as medidas já adotadas para fortalecer candidaturas de pessoas negras são necessárias, mas não suficientes para mudar o cenário desigual que existe hoje.

O próximo passo é adotar cotas raciais, diz Esteves, que é juiz auxiliar da presidência do TSE.

“Se quisermos corrigir a distorção que vemos no Parlamento, em algum momento vamos ter que reservar um percentual de candidaturas negras, não de vagas no Congresso”, afirma.

O juiz Fábio Esteves, em Brasília – Pedro Ladeira-12.set.20/Folhapress
A distorção a que ele se refere é evidente. Na Câmara dos Deputados, por exemplo, entre os 513 parlamentares eleitos em 2018, há 124 registrados como negros, classificação que inclui pretos e pardos.

Ou seja, pouco menos de 25%, embora os negros sejam mais de metade da população brasileira.

Reportagem da Folha, além disso, mostrou que esse percentual está superestimado, já que erros no registro do TSE inflam de maneira artificial a quantidade de pretos e pardos na Câmara.

Deputados que se autodeclararam negros e que terão direito a ações afirmativas se mantiverem registro

Para corrigir essa desigualdade, estão em vigor duas regras sobre o financiamento eleitoral. Uma delas determina que o dinheiro do fundo partidário e do fundo eleitoral seja repartido

Isto é, se um partido lançar 40% de candidatos negros, então 40% dos recursos deverão ser destinados a essas candidaturas.

A outra regra estabelece que votos dados a mulheres e pessoas negras serão contados em dobro para fins de distribuição do fundo partidário e do fundo eleitoral.

De acordo com especialistas, o financiamento eleitoral de mulheres e pessoas negras é um dos principais gargalos para essas candidaturas, ajudando a explicar, por exemplo, por que candidatos brancos têm pelo menos o dobro de chance de se eleger em relação a candidatos negros.

Para o juiz auxiliar da presidência do TSE, contudo, atacar esse problema não basta: “Só esse financiamento, sem percentual mínimo, ou seja, cotas, a gente vai andar muito pouco”, diz Esteves.

De acordo com ele, a iniciativa para fixar o percentual mínimo deveria partir do Congresso.

Hoje existe cota para mulheres –pelo menos 30% das candidaturas de cada partido devem ser femininas. A regra, no entanto, tem sido driblada por diversas legendas.

Até para evitar que as fraudes afetem as ações afirmativas de cunho racial, a comissão do TSE tem a fiscalização como um de seus eixos de trabalho.

“Não dá para as pessoas decidirem deliberadamente fraudar aplicação de recurso a candidaturas negras e isso ficar sem qualquer tipo de consequência. A prestação de contas vai exigir que os partidos políticos demonstrem a aplicação adequada dos recursos”, afirma Esteves.

Eventuais erros de registro, como os revelados pela Folha, não deverão levar à perda de mandato. A ideia, diz Esteves, é corrigir a rubrica de destinação da verba, o que pode gerar problemas financeiros para a agremiação.

“O partido fica impedido de receber novos recursos enquanto não ajustar as contas”, afirma o juiz auxiliar do TSE.

O MPE (Ministério Público Eleitoral) notificou, no último dia 7, os diretórios de todos os partidos políticos no estado de São Paulo e cobrou esclarecimentos sobre erros nos dados raciais no registro de candidatos a deputado federal.

A identificação de erros, diz o juiz, não se dará por uma espécie de tribunal racial. “O TSE está dialogando com os partidos, porque o filtro inicial vai ser feito pelos partidos.”

“Estamos num processo muito grande de letramento, de conscientização. Nós não usamos mais o critério biológico de raça”, diz Esteves. “Para uma pessoa se declarar negra, para ela ter o benefício da ação afirmativa, é preciso que seja uma pessoa que sofra discriminação.”

Ou seja, a autodeclaração pode não ser suficiente para fins de ação afirmativa, e o TSE pode usar bancas de heteroidentificação, como as que já existem em alguns vestibulares.

O Brasil, nesse ponto, adota um critério diferente do usado nos EUA, onde o pertencimento racial é determinado pela ascendência e pode ser determinado com mais facilidade.

Daí o esforço da comissão do TSE para criar balizas nesse tema. Com caráter consultivo, o grupo deve entregar um relatório com suas sugestões ao final da presidência do ministro Edson Fachin, no meio de agosto.


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