Segunda-feira, 18 de novembro de 2024, às 20:21:55- Email: [email protected]



ESCOLAS SOB AMEAÇA

Professores atacados por alunos com estilete em São Paulo (SP) e golpe de mata-leão em Itararé, no interior paulista. Um jovem de 16 anos esfaqueado pelo colega em uma escola de Poá, na região metropolitana. Três estudantes feridos por um colega com uma faca no Rio de Janeiro (RJ). Um adolescente levado à delegacia após chegar à sala de aula, em Cascavel (PR), com uma arma calibre .38.

As cenas ocorridas nas últimas semanas, enquanto os Estados Unidos se chocavam com as mortes de 19 crianças e dois adultos durante o massacre causado por um jovem de 18 anos na escola primária onde estudou em Uvalde, no Texas, jogam luz sobre a escalada da violência nas escolas em 2022.

Além disso, os episódios trazem à tona problemas sociais que se agravaram

Além disso, os episódios trazem à tona problemas sociais que se agravaram com a pandemia de Covid-19, como a desigualdade, ausência de políticas públicas de educação e de apoio à saúde mental.

Segundo estatísticas da Seduc-SP (Secretaria da Educação do Estado de São Paulo), houve aumentos expressivos em estatísticas como agressões físicas, humilhação sistêmica e ameaças, considerados os períodos de janeiro a março de 2019 e de 2022. O tema será alvo de debate na Comissão de Educação do Senado, após solicitação de Confúcio Moura (MDB-RO), em abril.

Simultaneamente, instituições públicas e particulares de vários estados vêm recebendo ameaças de massacre com alguma frequência desde o fim de março. Há relatos semelhantes em municípios de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pará, Mato Grosso do Sul, Alagoas, Rio Grande do Sul, Bahia, Tocantins, Goiás, Espírito Santo e do Distrito Federal.

Somente em cidades paulistas, no período de um mês – entre o início de abril e de maio –, a reportagem contabilizou 18 ameaças.

“Dia 20/05 haverá um massacre. E só 28 alunos escaparão”. “Massacre. Que comece o jogo. Tragam suas armas.” Recados como esses, nas paredes de banheiros dos estabelecimentos, nas redes sociais ou em áudios espalhados em grupos de mensagem, assustaram estudantes, famílias e profissionais envolvidos com a comunidade escolar nesse período.

As ameaças não se concretizam na grande maioria dos casos. Na menos danosa das hipóteses, entretanto, causam pânico a famílias, e colocam as instituições no dilema de escolher entre tratar as ameaças como “brincadeiras de mau gosto” ou cogitar o cancelamento das aulas até a apuração de cada caso.

Ameaça registrada em escola de Lagoa Santa (MG) (Imagens cedidas)

Ameaça registrada em escola de Lagoa Santa (MG) IMAGENS CEDIDAS

Em São Paulo, Daniele Farias viveu momentos de pânico ao saber pela filha, Ana Sabrina, que, a partir de um grupo de WhatsApp, um estudante ameaçou realizar um massacre na escola estadual Professor Jair Toledo Xavier, localizada no bairro da Brasilândia, zona norte da capital. Como outros pais, se indignou pela postura da instituição, que manteve as aulas e, segundo ela, não deu maior relevância ao caso.

“A reação foi de espanto quando minha filha falou comigo, eu soube por ela. E, indo para escola, vi vários pais indignados com o que estava acontecendo. Em nenhum momento a escola entrou em contato com a gente”, conta Daniele, que relatou se inquietar também com os recorrentes casos de brigas e agressões na porta do estabelecimento.

O chefe de gabinete da Seduc-SP, Henrique Pimentel, diz ter preocupação com o aumento das estatísticas de violência, mas não vê da mesma forma os casos de ameaças em instituições pelo estado.

“O único caso concreto que tivemos [em São Paulo] foi da [Escola Estadual] Raul Brasil. E eventuais ameaças são tratadas pela inteligência da Polícia Militar, e se deve notificar os casos. São exceções. Não podemos tratar as ameaças como uma realidade”, diz Pimentel ao R7, que explica ainda que, em casos específicos, a investigação e o acompanhamento ficam a cargo da segurança pública, em parceria com a educação.

Este cenário, porém, pode resultar em ataques como os de São Paulo e do Rio de Janeiro, ou até atentados mais graves, e expõe um contexto de dificuldades no acolhimento às crianças e aos adolescentes em ambiente escolar, sobretudo desde a volta às aulas presenciais – fator de influência para o aumento nas ocorrências de violência.

Apoio especializado

Psicólogas e demais entrevistados ouvidos pela reportagem ressaltam que, para além do melhor preparo dos docentes, a presença diária de profissionais especializados nas instituições pode ajudar a identificar alunos com potencial de agressividade, acolhê-los e prevenir ao menos parte desses casos.

“O psicólogo escolar não é um psicólogo clínico, ele precisa ter um olhar para observar várias coisas, não só as dificuldades escolares. Nesses momentos, principalmente, os fatores e situações de exclusão”, diz Elaine Alves, psicóloga com pós-doutorado em luto, emergências e desastres, do Instituto de Psicologia da USP (Universidade de São Paulo).

Elaine, que atuou no atendimento pós-traumático aos alunos, profissionais e familiares da E. E. Raul Brasil, em Suzano, afirma que, embora hoje o tema da inclusão seja constantemente debatido, a exclusão ainda é comum no ambiente escolar.

“Basta que se tenha uma diferença no grupo para que não te aceitem. Há muito preconceito. O que se deve trabalhar na escola, então – e a psicóloga pode ajudar orientando os professores –, é a questão do preconceito, e observar que todo mundo é rejeitado em alguma situação, como é se sentir rejeitado, e facilitar a inclusão”, afirma a psicóloga.

Se for feito um trabalho com estes adolescentes, possivelmente conseguiremos respostas comportamentais mais saudáveis

Ana Lúcia Castello, psicóloga

 


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