
O Brasil voltou à segunda colocação no ranking global de juros reais, atrás da Turquia e à frente de Rússia e Colômbia. Segundo cálculo feito pela MoneYou, a taxa real de juros no país atualmente é de 9,51%.
A empresa chegou a esse número considerando a taxa Selic de 15% ao ano e uma previsão de 4,45% de inflação para os próximos 12 meses, conforme o boletim Focus de 5 de setembro.
Especialistas apontam que o nível elevado reforça a atratividade do país para investidores de curto prazo, mas cria barreiras ao crescimento da economia interna.
Para Hugo Garbe, doutor em economia e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, juros reais altos funcionam como uma faca de dois gumes.
“Eles tornam o país atrativo para capital estrangeiro de curto prazo, pois títulos públicos e ativos de renda fixa oferecem retornos expressivos. No entanto, para a economia doméstica, o cenário representa um obstáculo: o crédito para empresas e famílias se torna mais caro, investimentos produtivos são desestimulados e o crescimento econômico desacelera”, afirmou.
O professor destacou que reduzir a taxa de forma consistente depende de mudanças estruturais.
“Seria necessário maior credibilidade fiscal e monetária, mercados financeiros mais profundos e reformas que aumentem a produtividade e a previsibilidade institucional.”
Efeitos sobre empresas e famílias
César Bergo, professor de mercado financeiro da UnB (Universidade de Brasília), considera surpreendente o fato de o Brasil manter taxa real superior à de países em guerra ou crise severa, como Rússia e Argentina.
Para ele, o dado revela fragilidades internas na condução econômica.
“É de se estranhar que nós tenhamos essa taxa de juros real maior do planeta, perdendo apenas para a Turquia e também acima da observada em países com problemas de guerra, geopolítica ou crise econômica”, avaliou.
Segundo Bergo, os impactos recaem diretamente sobre crédito e investimentos.
“Você inibe a formação de capital de giro pelas empresas, porque ela depende do crédito para realizar essas operações. O custo de oportunidade de investir na produção é alto. Muitas companhias preferem aplicar recursos no mercado financeiro em vez de investir, comportamento semelhante ao das famílias.”
Ele acrescentou que juros elevados atraem capital especulativo de curto prazo, mas prejudicam a atividade produtiva e a geração de empregos.
Para reduzir taxas de forma consistente, o professor defendeu a necessidade de equilíbrio fiscal.
“Hoje, a política fiscal expansionista do governo caminha em sentido oposto à política monetária contracionista do Banco Central. Esse conflito dificulta avanços.”
Contraponto
Embora o Brasil apareça em posição de destaque no ranking, parte dos economistas questiona a comparação direta entre países.
Para esse grupo, o parâmetro mais adequado é a diferença entre a taxa vigente e a chamada “taxa neutra de juros”, indicador baseado nos fundamentos da economia e sem pressão inflacionária.
No Brasil, a taxa neutra é estimada em 5,5%, segundo o Banco Central.
Para Benito Salomão, professor do Instituto de Economia e Relações Internacionais da UFU (Universidade Federal de Uberlândia), “o que importa não é o ranking, mas a distância da taxa em relação à neutra”.
“Hoje, nossa taxa real está cerca de quatro pontos acima dela, o que significa política monetária contracionista, voltada a conter pressões inflacionárias e a garantir a atração de investimentos externos.”